Responsabilidade Social: o que falta fazer na Indústria da Moda?

O presente artigo retrata um conjunto de questões, muitas com respostas definidas e outras nem tanto, mas servem para sensibilizar a importância de analisar a sustentabilidade como um todo, ou seja, com base nos seus três pilares: social, económico e ambiental.

É importante abordar a responsabilidade social, quando se fala em “moda sustentável”. Por vezes, os assuntos principais recaem na escolha das matérias-primas naturais e biodegradáveis, nas técnicas de produção que prezam a diminuição de água e gases do efeito de estufa e na distribuição das peças de roupa, seja até aos pontos de venda ou ao consumidor. Todos estes aspetos são relevantes, mas correspondem à esfera ambiental do processo.

De fora acabam por ficar temas sensíveis, tais como: condições de trabalho e salários dignos dos operários fabris, das costureiras, dos agricultores que cultivam algumas das matérias-primas; a utilização de mão-de-obra infantil; os países em que a roupa é confecionada; e o apoio a projetos sociais.

Estarão os consumidores preparados para refletir sobre estas temáticas, quando vão às compras? Será que alguém prescinde da peça bonita e que lhe assenta bem, porque é produzida num país cujas práticas sociais, ambientais e económicas são duvidosas?
Na FashionHub procuram-se respostas para estas e outras questões, deste modo, irei apresentar em breve os resultados e conclusões de um estudo em que comparei a intenção de compra dos consumidores com o comportamento que adotam durante a ação de compra. De uma forma genérica e pouco rigorosa, para já, os resultados apontam que há mais percentagem de pessoas a refletir sobre a produção das peças de roupa e condições dos trabalhores que as confecionam, no entanto, quando efetuam uma compra esse requisito passa para segundo ou terceiro plano, existindo outros fatores mais relevantes, como o preço (barato) das peças. Mas deixo esta temática para outro artigo, pois haverá muito para explicar e esmiuçar.

O presente artigo retrata um conjunto de questões, muitas com respostas definidas e outras nem tanto, mas servem para sensibilizar a importância de analisar a sustentabilidade como um todo, ou seja, com base nos seus três pilares: social, económico e ambiental. E, serve também, para assinalar uma das datas mais terríveis na história da Indústria da Moda, que não devemos esquecer e, pelo contrário, devemos procurar aprender algo através dela – 24 de abril de 2013. O dia em que o mundo acordou com a tragédia do Rana Plaza, que expôs as fragilidades da (glamorosa) indústria da Moda.

O que foi a tragédia do Rana Plaza?

O dia 24 de abril de 2013 foi um dos dias mais negros na história da indústria da moda. O desabamento do edifício Rana Plaza, no Bangladesh, provocou a morte de 1.134 pessoas e deixou feridas mais de 2.500. O prédio de oito andares era um centro de oficinas de costura terceirizadas por grandes marcas, como Mango, Benetton e Primark, no país conhecido por oferecer mão-de-obra barata. As imagens dos destroços, que parecem de um cenário bélico, chocaram o mundo, mas retratam a “guerra” da indústria têxtil e de vestuário, que deixou muitos problemas a nu.

Muitas marcas conhecidas na Europa e em todo o mundo, como as já mencionadas, produziam roupas neste edifício e (consciente ou inconscientemente) aceitaram que a segurança dos trabalhadores não era um problema, já para não mencionar as restantes condições de trabalho.

Andrew Biraj | Reuters

Dias antes do que aconteceu com o Rana Plaza…

Os trabalhadores notaram rachaduras no prédio dias antes, mas foram pressionados a continuar a trabalhar nessas circunstâncias, com ameaças de retenção de um mês de salário caso não o fizessem.

Uma série de problemas desencadearam o colapso: as vibrações dos geradores a diesel ligados devido a uma queda de energia; os maus materiais do edifício e a construção sobre um antigo lago. No entanto, apesar dos avisos contra a sua atividade, foi aprovado para uso industrial.

Do processo resultaram 38 pessoas acusadas de homicídio, incluindo proprietários de fábricas e funcionários públicos, mas os julgamentos continuam pendentes.

A catástrofe revelou a realidade das condições de trabalho nas fábricas de vestuário – quão pouco estes trabalhadores recebem, os perigos que os rodeiam e como isto se relaciona com as roupas que vestimos.

Que medidas foram implementadas para evitar que situações destas se repitam?

À medida que o consumo e a produção aumentam ao longo do ano, as empresas recorrem à produção offshore em locais onde os salários são mais baratos e as leis laborais podem ser exploradas.

As marcas e os seus fornecedores fabricam mais, apesar do custo para as pessoas e para o planeta.

Os resultados são camisolas feitas por cêntimos e tendências de passarela a chegar às lojas em poucos dias. A Indústria acelerou, tornando-se naquilo que conhecemos como fast fashion.

A tragédia resultou em algumas ações importantes, que continuam a abrir caminho para tentar melhorar a indústria. Uma delas é o Acordo de Bangladesh, que apertou o cerco para a responsabilização das fábricas e marcas para garantir inspeções de segurança contra incêndio e desabamento, além de melhorias para a saúde e segurança dos trabalhadores.

Apenas algumas semanas após o colapso do prédio comercial de oito andares, onde se produziam roupas para empresas europeias, algumas marcas, sindicatos e ONGs assinaram o Acordo de Construção e Segurança contra Incêndios.

O acordo inclui provisões para inspeções de segurança independentes, programas de formação e um procedimento de queixa para trabalhadores. Entre as principais marcas europeias que o assinaram estão a H&M, Primark, C&A, Zara e Marks & Spencer.

Contudo, embora o acordo tenha aumentado a consciencialização sobre os riscos de segurança no Bangladesh, Paquistão e noutros países em situação semelhante, a indústria continua a pagar salários abaixo do limite do salário mínimo.

O que os consumidores na Europa podem fazer?

A indústria da moda “em grande parte não é regulamentada” noutras regiões do planeta, além da Europa. Não há razão para produzir tanto vestuário como acontece atualmente, com impactos ambientais significativos. A deslocalização da produção para países onde a mão-de-obra é barata e as leis ambientais ou de proteção dos trabalhadores são praticamente inexistentes.

E enquanto as marcas europeias introduziram um conjunto de regulamentações do trabalho para proteção social, os países fora da UE não beneficiam destas diretrizes.

O movimento Fashion Revolution nasceu após o que aconteceu no Rana Plaza e tem o propósito de sensibilizar e informar sobre estas questões e encoraja os consumidores a perguntar publicamente às marcas sobre a produção nas redes sociais, através da hashtag #WhoMadeMyClothes.

As marcas devem mostrar ações mais concretas do que fazem na sua produção para combater este flagelo. Porém, um dos papéis principais desta história continua do lado do consumidor, que deve pensar nas roupas como investimentos de longo prazo, desta forma, deve adotar medidas para diminuir o consumo e tomar decisões informadas quando é necessária uma compra.

Na FashionHub também estamos constantemente a alertar para analisares a etiqueta da tua peça de roupa, desde a origem da peça às matérias-primas usadas na composição e, acima de tupo refletir: “Será que preciso mesmo de comprar?”

Assim, estarás a contribuir para reforçar uma indústria da moda mais sustentável na vertente social, ambiental e económica.

Podes ler também o nosso artigo “Dicas para o consumidor iniciar a jornada sustentável”.